Em 1976, o “Daily Mirror” ainda vendia mais que o “The Sun”. Valia-lhe o nervo de estar onde era preciso, quando era preciso, e o sábio domínio do “vamos fazer disto notícia”, a acreditar, e muito, que a fotografia inesperada haveria de contar a história quase toda. A atitude levou o jornal a fabricar o arquivo Mirrorpix, um armazém de memórias de referência (em funcionamento desde 1903, quando o “Mirror” foi fundado) mas também uma inteligente fonte de receitas. Esta gente dedica boa parte do seu tempo a licenciar fotografias para editoras como a Ammonite poderem fabricar objectos de belo efeito, entre o “decorativo-cool” e a oportunidade quase única de recuperar histórias fundamentais. Exemplo perfeito destas duas personalidades livreiras juntas: “Punk! The Culture in Pictures”.
300 páginas não é exagero para matéria prima que ainda hoje inspira muito boa gente. Texto vê-se pouco, que não houve aqui tempo para explicações e análises históricas que nunca seriam carimbadas de “novidade”. Antes, “Punk! The Culture in Pictures” revela fotos de uma Grã-Bretanha na década de 70 a gerar um dos mais importantes movimentos da cultura popular das últimas décadas (ao mesmo tempo que a revolução acontecia também nos EUA). E boa parte desta narrativa é feita a partir de documentos inéditos. Ou – e este é detalhe igualmente aliciante – publicados apenas pela segunda vez, anos depois da sua impressão original em papel.
Contas feitas, são 500 fotografias a recordar heróis e seguidores, tanto os que protagonizaram a vanguarda, dos Clash aos Sex Pistols, como todos os outros que a seguiram. Rock’n’roll sem maquilhagem, a apontar o dedo aos excessos do mainstream. Nada de “quanto mais melhor”. Pelo contrário, a doutrina tinha como princípio o “faça-você-mesmo”. As bandas geravam fãs que geravam bandas. Os seguidores podiam finalmente ser protagonistas e a confusão era fenómeno natural. A rebeldia juvenil e a imagem a condizer fizeram-se obrigatórias e transformar tudo isso em fotografias era, para um jornal diário, tarefa essencial.
Do “Daily Mirror” para as edições livreiras a bajular o passado, a história aparece bem contada porque as imagens vêm dos sítios certos. Os concertos onde quase tudo estaria prestes a acontecer; as ruas a receber desfiles de pioneiros que, na verdade, não ligavam puto ao futuro que aí vinha; as atitudes anti-sistema mais os penteados que odiavam os bons-costumes e ainda os piores amigos dos Conservadores, que já mandavam e se preparavam para receber Thatcher de braços abertos.
Tudo a mudar entre 1974 e 1976, a implodir e a tomar o mundo de assalto em 77, para depois nada voltar a ser o mesmo. Qual “no future” qual quê.
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ResponderEliminarEm 1976, o “Daily Mirror” ainda vendia mais que o “The Sun”. Valia-lhe o nervo de estar onde era preciso, quando era preciso, e o sábio domínio do “vamos fazer disto notícia”, a acreditar, e muito, que a fotografia inesperada haveria de contar a história quase toda. A atitude levou o jornal a fabricar o arquivo Mirrorpix, um armazém de memórias de referência (em funcionamento desde 1903, quando o “Mirror” foi fundado) mas também uma inteligente fonte de receitas. Esta gente dedica boa parte do seu tempo a licenciar fotografias para editoras como a Ammonite poderem fabricar objectos de belo efeito, entre o “decorativo-cool” e a oportunidade quase única de recuperar histórias fundamentais. Exemplo perfeito destas duas personalidades livreiras juntas: “Punk! The Culture in Pictures”.
300 páginas não é exagero para matéria prima que ainda hoje inspira muito boa gente. Texto vê-se pouco, que não houve aqui tempo para explicações e análises históricas que nunca seriam carimbadas de “novidade”. Antes, “Punk! The Culture in Pictures” revela fotos de uma Grã-Bretanha na década de 70 a gerar um dos mais importantes movimentos da cultura popular das últimas décadas (ao mesmo tempo que a revolução acontecia também nos EUA). E boa parte desta narrativa é feita a partir de documentos inéditos. Ou – e este é detalhe igualmente aliciante – publicados apenas pela segunda vez, anos depois da sua impressão original em papel.
Contas feitas, são 500 fotografias a recordar heróis e seguidores, tanto os que protagonizaram a vanguarda, dos Clash aos Sex Pistols, como todos os outros que a seguiram. Rock’n’roll sem maquilhagem, a apontar o dedo aos excessos do mainstream. Nada de “quanto mais melhor”. Pelo contrário, a doutrina tinha como princípio o “faça-você-mesmo”. As bandas geravam fãs que geravam bandas. Os seguidores podiam finalmente ser protagonistas e a confusão era fenómeno natural. A rebeldia juvenil e a imagem a condizer fizeram-se obrigatórias e transformar tudo isso em fotografias era, para um jornal diário, tarefa essencial.
Do “Daily Mirror” para as edições livreiras a bajular o passado, a história aparece bem contada porque as imagens vêm dos sítios certos. Os concertos onde quase tudo estaria prestes a acontecer; as ruas a receber desfiles de pioneiros que, na verdade, não ligavam puto ao futuro que aí vinha; as atitudes anti-sistema mais os penteados que odiavam os bons-costumes e ainda os piores amigos dos Conservadores, que já mandavam e se preparavam para receber Thatcher de braços abertos.
Tudo a mudar entre 1974 e 1976, a implodir e a tomar o mundo de assalto em 77, para depois nada voltar a ser o mesmo. Qual “no future” qual quê.
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ResponderEliminarTexto da autoria de:
Tiago Pereira, publicado em 12 Abr 2012 - 10:29
Retirado de...
http://www.ionline.pt/boa-vida/punk-revolucao-foi-fotografada
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