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quarta-feira, abril 20, 2011

Rui Rocker (Crise Total) - entrevista

Rui Rocker é uma figura inconfundível e mesmo emblemática no punk português, tanto pela sua contínua actividade como guitarrista, como pelo espírito, atitude e postura (não só em palco) que sempre demonstrou e lhe atribuiu um carácter especial.

Ficou conhecido para sempre como músico dos Crise Total, mas esteve sempre envolvido com bandas e projectos, tendo mais relevo nos últimos anos com Rolls Rockers e actualmente com a recente banda Asfixia.

A experiência e honestidade do Rui são como uma ´marca registada` que leva muita gente a procurá-lo e a pedir conselhos.

O Billy News elaborou algumas questões que aborda o passado, presente e um futuro próximo que teima em não o deixarmos de ver em palco a actuar.

E ainda bem que assim é.

Billy- Quem te conhece pessoalmente sabe que tens sempre mil histórias para contar sobre os finais da década de 1970 e início da seguinte. Como te atraiu o movimento punk, lembraste dos primeiros tempos?

Rui Rocker-Talvez um dos principais responsáveis por eu ter tido acesso ao movimento punk tenha sido o meu pai ,pois frequentemente me levava a Londes e mostrava-me tudo o que havia para além do Turismo,desde freak´s ,rockers ,mods punks e não sei porquê a tendência dele era sempre irmos a Pubs frequentados por Punks na sua maioria (que era sempre um problema devido a minha idade).Para ajudar a festa oferecia-me frequentemente discos de bandas punk ,estou-me a lembrar Sex Pistols ,Ramones ,Uk Subs e muitos outros ,mas também a dar-me no meio doses de rock que era mais a onda dele.

Claro como puto de 13 anos tinha que optar por uma cena diferente do meu pai, logo optei por tentar saber mais a fundo o quê e o Porquê daqueles gajos esquisitos com o cabelo todo fodido quem chamavam punks .

Claro Tudo isto seria bonito e fácil se não estivéssemos em Portugal.Os primeiros tempos foram terríveis ,íamos dentro todos os dias ,não por fazer merda ,mas porque éramos diferentes e acima de tudo muito poucos ,lembro-me do pessoal da área de Lisboa e arredores encontrar-se na feira da ladra ao sábado a porta duma tasca que salvo erro se chamava Tabuense,mas acabava por ser caricato ,as pessoas ficavam a toa porque não sabiam muito bem o que nós éramos ou que ideias é que tínhamos,de maneira que as reacções eram do melhor ,havia aqueles que fugiam,os que apontavam,os que mandavam bocas os que não tinham reacção absolutamente nenhuma a não ser ficarem de boca aberta a abanar a cabeça ...e as autoridades que para todos os efeitos pregos´, cabelos espetados e roupa pintada era sinonimo de banditismo como tal leva pa dentro ,com as desculpas mais esfarrapadas tipo ofensa a moral publica ,devido aos escritos nos blusões,posse de arma branca por causa das pulseiras e cintos de cardas,etc

De certa forma era bem giro,porque nunca nos associavam á contestação social ,mas sim como gajos estranhos ,drogados, bandidos e muito raramente artistas.


Billy- Quando é que pensaste que querias formar uma banda? O primeiro projecto chamava-se apenas Crise?

Rui Rocker-Essa ideia surgiu em 1978, se já chamava-mos a atenção pelo visual,porque não levar a causa mais longe e utilizar também a musica como forma de contestação,afinal no Algueirão nessa altura havia bandas de rock , blues,pop e outras coisas estranhas ,mas não havia punk rock então nascem os Choque que tiveram a sua 1ª actuação no liceu da Portela de Sintra em Março de 1978,logo após esse concerto a banda chega a conclusão que Crise deveria ser o nome adequado para o projecto uma vez que definia a nossa verdadeira situação social,não havia instrumentos electrificados nem sala de ensaios e foi precisamente num desses ensaios no meio da rua que o saudoso Farinha Master nos veio abordar sobre o que é que estávamos a fazer no meio da rua a rasgar as guitarras espanholas de Badajoz.Depois de uma breve explicação fomos convidados a tocar e ensaiar na garagem dele com o material dos Wc Porno e a partir daí surgiram os Crise mais a sério .

Billy- Já como Crise Total, que memórias guardas dos tempos do Rock Rendez-Vous e da altura em que sentiram que marcaram definitivamente a música nacional, ou pelo menos a música punk portuguesa?

Rui Rocker-Epá o Rock Rendez-Vous ,surgiu numa altura em que nós como banda estávamos á toa, tínhamos sido banidos de tudo quanto era escolas e liceus e bailes na zona de vez em quando lá aparecia uma festa privada , o Manolo tinha entrado para a banda a relativamente pouco tempo e decidimos concorrer ao 1º Concurso de Musica Moderna só com a cena de irmos tocar num palco a sério ,com amps a sério ,Pa a sério o que dava para mais uma vez fazer contestação a sério ,e claro vai de gravar 4 malhas com um gravador a pilhas mono ,numa cassete de ferro bem rasca e embrulhar tudo numa folha a dizer Crise Total ...punks not dead.Qual foi o espanto quando consultamos a lista de apuramento para o concurso estava lá Crise Total,nem quisemos acreditar ,mas lá fomos um bocado desconfiados (quando a esmola é grande o pobre desconfia).Quando acabamos a dita actuação e depois de termos tocado mais uma musica que as outra bandas a concurso (porque as nossas eram muito rápidas),o espanto ainda foi maior quando entra uma jornalista (Ana Rocha) a fazer-nos uma entrevista para ser publicada no jornal A Capital , a dar-nos os parabéns que tínhamos ganho a eliminatória e tínhamos recebido o prémio de revelação o que nos ia proporcionar mais idas ao RRV o que era óptimo.

Acho que nessa altura não nos apercebemos bem do impacto que Crise Total poderia trazer ao punk Rock Português ,ficamos sim com a noção que poderíamos chegar com a nossa contestação a mais gente e talvez (como veio a acontecer) termos oportunidade de tocar noutros locais ou seja chegar ainda mais longe.


Billy- O regresso em 1995/6 foi bastante fulgurante e bastante feliz, apesar de ser só com 50% dos elementos originais, o disco lançado “A Crise Continua” e a quantidade de excelente concertos dados foi importante (tal como a actuação no festival em Faro). O que aconteceu para as coisas abrandarem cerca de um ano depois?

Rui Rocker-O regresso de 1995/96 surge por grande culpa do João Rolo ,que veio falar comigo e com o João Filipe ,sobre o pessoal ter saudades de Crise Total e que havia músicos disponíveis e com vontade de fazer reviver o espírito da banda.Tanto eu como o João Filipe ,aceitamos , o panorama politico em Portugal era propício e a coisa até correu mais ou menos bem .,mas depois de termos dado concertos durante um ano e alguns meses chegamos a conclusão que já não fazia muito sentido continuar a tocar as mesmas malhas,as saudades quem tivesse que as matar já tinha tido oportunidade,ainda houve umas tentativas de fazer uns originais ,mas já não era o mesmo e a coisa acabou por ficar por aí.

Foi bom e útil no contexto politico dessa altura ,mas não tinha a genuinidade dos anos 80


Billy- Tu nunca paraste, apesar dos vários interregnos dos Crise Total, seja como convidado de alguns projectos ou fazendo parte mesmo de outras bandas. Conseguiste sempre conciliar a actividade de músico ao longo da tua vida ou fizeste paragens significativas em que sentiste necessidade de parar?

Rui Rocker-Não nunca parei ,apesar de ter andado em cenas muito diversificadas e talvez as diferenças de projectos (desde o teckno,pop,experimentalismo,rock,etc) tenha contribuído para nunca ter sentido vontade de parar,mas sim de variar , fazer o que gosto e defender as minhas causas com outras sonoridades,acima de tudo fazer sempre o que gosto mantendo-me fiel aos meus princípios.


Billy- Nos últimos anos, a banda mais ´visível` onde estiveste foram os Rolls Rockers, por muitos anos (isto para além dos ´Crise [Quase] Total com Zorb dos Dalai Lume nas vozes). Deram imensos concertos, chegaram a ir tocar no estrangeiro, lançaram umas demo`s, mudaram de vocalista várias vezes, mas ao fim de tanto tempo decidiram parar. Ainda hoje pensas que foi a decisão certa?

Rui Rocker-Acho que Rolls Rockers parou onde devia . Apesar de ter sido convidado para tocar nessa banda numa fase muito inicial ,foi uma das bandas que me deu muita pica tocar e gostava mesmo daquilo ,mas entretanto começaram a surgir divergências musicais e decidimos parar.

Até quem sabe qualquer dia a gente se possa juntar de novo para Rockar mas para já parou e parou muito bem


Billy- Os Crise Total regressaram, juntamente com Manolo (vocalista original) que nunca se tinha juntado desde a década de 1980. Já fizeram duas mini-digressões, uma em 2009 e outra no ano passado. A ideia é juntarem-se uma vez por ano? Enquanto houver vontade e espírito para interpretar os temas?

Rui Rocker-Pois essa ideia surgiu com o aparecimento e disponibilidade da parte do Manolo que falou comigo e penso que com o João Filipe (este devido á sua vida privada não teria disponibilidade) .E lá nos juntamos para dar uns toques sempre que o Manolo tiver disponibilidade e a conjuntura politica o exigir.

A ideia é fazer uma mini tour todos os anos se possível , e gravar alguns temas que nunca apareceram em gravações ou nunca foram gravados em disco.


Billy- Como te é habitual, não páras. Formaste os Asfixia que têm dado excelentes concertos um pouco por todo o país. O público tem reagido muito bem a esta nova banda e aos temas. Sempre ajuda ter alguns elementos bem experientes nestas andanças (para além de ti, o Jonhie dos Simbiose e mesmo contando com boa prestação dos ´jovens` Marden e Inês Menezes). Concordas que foi um arranque com uns degraus mais acima do normal, para qualquer outra banda que se iniciasse agora, ou nem por isso?

Rui Rocker-Claro que concordo,é a primeira vez que uma banda minha de raiz é recebida tão bem no meio,não sei se é bom se é mau ,mas que nos está a dar mais pica para continuar e com mais força lá isso está.

Alem da formação já ter alguma experiência ,tivemos a sorte de ser basicamente apadrinhados pelos grandes Gazua ,que partilharam a TourNado connosco que nos ajudou a espalhar a nossa sonoridade praticamente a todo o País.Um Grande bem haja para eles.




Billy- Editaram uma ´demo` com alguns temas, mas é impossível traduzir o calor e a vossa postura efusiva em palco, para uma gravação digamos ´do it yourself`. Pensam gravar algum disco proximamente num estúdio profissional? Há planos para editar um álbum completo, digamos com umas dez ou doze faixas?

Rui Rocker-Sim a seguir ao festival Outsider 4 (onde vai haver uma surpresa na formação dos Asfixia),estamos a pensar entrar em estúdio para fazer um álbum com 12 /13 temas, temos algumas editoras interessadas,mas nada de concreto para já vamos gravar e depois logo se vê.



Billy- E agora a questão final, que já te devem ter colocado imensas vezes ao longo da tua vida. Até quando pensas ser um ´jovem`? Tens alguma previsão de quando irás parar de actuar em palco, de ir em digressões, de carregar material da carrinha para o palco e vice-versa?

Rui Rocker-No dia em que eu deixar de pensar que sou jovem ,estou feito ao bife já fui hehehe,não me vejo a parar de actuar tão cedo a não ser que surja uma impossibilidade física fazer musica sem pisar palcos não é propriamente para mim ,nem que seja no estacionamento com um gerador ou com uma cadeira de rodas com cardas enquanto o esqueleto der eu vou estar lá.O QUE NASCE TORTO JAMAIS SE ENDIREITA.


11 comentários:

Ivy Kiara disse...

Boa entrevista...

Anónimo disse...

diria excelente mesmo com imensos detalhes do rui, muito bom.

Sheena disse...

Muitos parabéns ao Billy pela EXCELENTE entrevista a este grande senhor do (punk)rock português. Mais um contributo importante deste blog para a história /cultura musical nacional. Obrigada.

Zorb disse...

PARABÉNS a letras GARRAFAIS! ;o)

Unknown disse...

Há grande Rui..... E viva o punkrock........

Unknown disse...

Exelente...
Há grande Rui!!!
E viva o PunRock.....
Parabéns.

Anónimo disse...

Ganda entrevista, pá. Muito bom.

bidgi disse...

assim se fala em bom punktuguês...
muitos mais tenham atitude e irreverencia semelhante, sao os meus votos para 2013. hehe
rock'n'rolling

Unknown disse...

Excelente!

Anónimo disse...

eterna saudade deste senhor

Pajmart disse...

Muito bom! Saudades do velhote.